Entrevista à Assistente Social do Estabelecimento Prisional
Boa tarde, somos alunas da Escola Secundária Vitorino Nemésio e estamos aqui no âmbito da disciplina de Área Projecto. Começamos desde já por agradecer a sua disponibilidade para comparecer a esta entrevista. Estamos a desenvolver um trabalho sobre a vida dos reclusos dentro dos estabelecimentos prisionais e a possibilidade ou não da reinserção dos reclusos na sociedade.
Queríamos, portanto, realizar uma entrevista onde nos possa fornecer algumas informações para o nosso trabalho, passando agora as perguntas:
1. O que a levou à escolha da sua profissão?
O poder ajudar os outros, dar o contributo à sociedade da melhor forma que souber e conseguir com os recursos existentes na comunidade quer organizada quer civil; contribuindo para a construção de projectos de vida estruturados.
2. Gosta da sua profissão? Há quanto tempo a exerce?
Sim, gosto. Desde 1998, portanto há…12 anos.
3. Quais as habilitações e/ou formações necessárias para ser assistente social?
As que foram necessárias para ser assistente social a nível de habilitações literárias foi o 12º ano (1992) e a prova de acesso ao ensino superior (história e filosofia), Instituto Superior de serviço social, curso: assistente social.
4. Quais são as suas funções ?
A assistente social tem um grande objectivo: a reinserção social. Partindo do princípio de que o indivíduo já está preparado para viver em liberdade, há que preparar agora a sociedade para aceitar o devolvido. Por exemplo, na sua casa aceitaria como empregada doméstica uma pessoa que já tinha sido condenada por tráfico de droga? Quem corre o risco de a deixar todo o dia sozinha em casa? A maioria das pessoas honestas e bem-intencionadas não quer correr esse risco. E eu, com a experiência que tenho, penso que as pessoas, individualmente, têm razões para não correr o risco. Só que a sociedade cria os seus próprios delinquentes, e compete-lhe a ela criar estruturas de prevenção e de apoio aos delinquentes, uma vez em liberdade.
Bom, o meu trabalho é então contactar instituições, pessoas, familiares de reclusos ou ex-reclusos, com o intuito de lhes prestar assistência, trabalho, apoio económico, apoio afectivo, etc..
5. Considera a sua profissão, uma profissão de risco?
Eu considero que sim, porque muitas vezes tenho utentes que poderão estar desestruturados, fragilizados, sem meios económicos para fazer face às despesas básicas de subsistência, sem qualquer tipo de suporte familiar o que poderá muitas vezes levar a situações de eventual “agressividade”. Por outro lado a falta de recursos na comunidade adequados às necessidades dos mesmos é outro dos motivos que eventualmente poderá descompensá-los e levá-los a atitudes menos correctas.
6. Já alguma vez foi ameaçada? De que modo?
Sim. A minha experiência profissional também passou pela área do actual rendimento social de inserção. Partindo do princípio que a medida pressupunha a declaração de bens e rendimentos por parte dos utentes e na sequência do acompanhamento social a uma família, a prestação do agregado familiar foi cancelada por falsas declarações o que levou a uma atitude “violenta” de ameaça verbal.
7. Trabalha com que tipo de reclusos?
Trabalho com reclusos dependentes de drogas quer lícitas (álcool, cerveja, ou seja, coisas legais) quer ilícitas (drogas ilegais (heroína, cocaína, haxixe..).
8. Considera que existe reinserção social dos reclusos na sociedade?
Sim há. E há várias formas, a reinserção abrange a reinserção social (na comunidade), a reinserção familiar (relações de família/amizade), e a reinserção sócio-laboral. Com a intervenção do serviço social tenta-se a médio, longo prazo e em articulação com o estabelecimento prisional, preparar a plena reinserção do recluso na sociedade, passando a mesma por um projecto estruturado que avalie as necessidades e tente minimizá-las/solucionar as mesmas à data de ser restituída a liberdade. Podendo as mesmas ser: alojamento, alimentação, e o desemprego.
A nível sócio-laboral existem medidas de emprego específicas, não para utentes reclusos mas para utentes que se encontrem em tratamento quer ambulatório quer em espaços protegidos, que se encontrem organizados.
Existe por exemplo o “programa vida emprego”, que tem por finalidade potenciar a reinserção social e profissional de consumidores de drogas ilícitas com parte fundamental do processo de tratamento e reinserção. Promove assim o desenvolvimento de acções nas vertentes de informação, orientação e formação profissional, bem como na integração sócio profissional designadamente através de um conjunto de medidas especificas, como por exemplo: estágios de integração.
9. Existem muitas empresas disponíveis para empregá-los?
Existem algumas, mas normalmente são as câmaras municipais e as juntas de freguesia que têm mais abertura. Até porque são as que mais se coadunam com a experiência profissional e habilitações literárias dos nossos utentes. Empregos na área da jardinagem, limpeza de ruas (…). Bem, passa também muito pela mudança de mentalidades e trabalho conjunto de sensibilização.
10. Podem voltar a ter uma vida socialmente aceite?
Sim… contudo passa pelo (re)fazer de relações quer familiares, sociais e comunitárias. Porque muitas vezes há o corte com a família. Modificam-se as relações sociais quer sejam elas de amizade ou conjugais e a própria forma da sociedade os aceitar. Isto implica um esforço quer pela parte dos próprios quer das entidades que os acompanham.
11. Há muitos utentes que são reincidentes nos crimes cometidos? Porquê?
Sim. Muitas vezes não têm estruturas de apoio suficientes por exemplo o apoio familiar que lhes permitam uma efectiva organização sendo a forma mais fácil os delitos. As dificuldades quer económicas quer sociais, associadas à baixa taxa de tolerância poderá levar à reincidência.
12. Conhece alguém que foi injustamente condenado?
Não.
13. Na sua opinião considera que o estabelecimento prisional faz com que os criminosos se arrependam dos crimes que cometeram?
É uma pergunta complicada, alguns sim, alguns não. Nem que seja por ficarem privados da liberdade que é a melhor coisa que temos.